O Brasil viu nos últimos meses, o povo sair às ruas buscando melhores condições de vida, bradando contra a corrupção, contra tudo e contra todos. Movimentos assim não aconteciam no país desde 1992, quando os caras-pintadas ajudaram a derrubar Collor do poder. O Brasil se acostumou a ver protestos durante a ditadura e na campanha das Diretas, que pedia a volta à democracia. Estes movimentos sempre tiveram músicas populares que os marcaram. Artistas jovens compunham hinos que eram levados às ruas e cantados a plenos pulmões pelos ativistas. Mas e hoje? Que música seria cantada nas ruas? Que artista jovem representaria este movimento?
Durante a ditadura surgiram músicas que se tornaram clássicas canções de protesto, como “Para não dizer que não falei das flores” de Geraldo Vandré, que até hoje é símbolo de resistência. Chico Buarque é autor de diversas músicas usadas para protestar, como “Apesar de Você” e “Roda-Viva”. Chico virou um marco contra a ditadura, mesmo que não assuma este rótulo.
Quando o povo foi às ruas, a partir de 1984, no movimento das “Diretas Já”, o rock estava dominando as rádios e a televisão brasileira. Logo, um dos maiores hinos do movimento veio de uma banda de rock paulistana que dizia que “a gente somos inútil”. A música do Ultraje a Rigor virou um dos símbolos do movimento e teve seu papel no imenso movimento que tomou as ruas do Brasil. No mesmo movimento, vários cantores estavam engajados e Fafá de Belém, cantando Coração de Estudante, de Milton Nascimento e Wagner Tiso, foi consagrada como a “Musa das Diretas”.
É claro que nas Diretas Já, músicas como as de Vandré e Chico foram lembrados. Entretanto, neste período, bandas de rock surgiam para dar um tom novo e um ar mais jovial ao movimento. Barão Vermelho e Legião Urbana representam bem o período, muito embora não tenham participado diretamente do movimento. No dia em que Tancredo foi eleito para a presidência, tinha início o primeiro Rock in Rio e Cazuza subia ao palco enrolado em uma bandeira do Brasil e dizia que o Brasil precisava mostrar a sua cara.
No início dos anos 90, estas caras foram pintadas de verde e amarelo pedindo o impeachment de Collor. Aí, apareceu “Zé Ninguém”, do Biquíni Cavadão. “Eu sou do povo, eu sou um Zé Ninguém, aqui embaixo as leis são diferentes” cantavam os jovens nas ruas.
Hoje nas ruas não se canta uma música atual, simplesmente porque não se tem nada no cenário musical de hoje que fique na memória e na história. A música que faz sucesso no Brasil hoje é altamente comercial e artistas são preparados para fazer sucesso. Tudo muito efêmero. Algo que surgisse dizendo representar o movimento seria puramente por oportunismo e certamente de péssima qualidade. Os gritos de torcida de futebol e uma ou outra música antiga eram cantados nas ruas, mas o povo não ouvia algo novo. Os professores de história não poderão ligar o movimento a uma canção como hoje se faz nas salas de aula. O que resta ao povo é torcer para que o país melhore e isso se aplica também à música.